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Festa da Boa Morte

Muito mais do que tecido: as histórias contadas pelas vestes da Festa da Boa Morte 

Layla Shasta | Mestranda do PPGCOM - UFRB 

 

É chegado o dia 15 de agosto e as ruas de Cachoeira, no Recôncavo da Bahia, preenchem-se de branco, preto e vermelho. As cores estão nas camisas, saias e xales usados pelas integrantes da Irmandade da Boa Morte ao saírem em procissão na data mais importante da Festa, de mesmo nome, que há séculos celebra Nossa Senhora. Durante os dias da festividade, elas assumem, para cada ritual, vestimentas com diferentes cores, jóias e significados. É um “tear” de simbologias que virou tema de pesquisa para a professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da UFRB Renata Pitombo. A análise, que resultou no livro "As vestes da Boa Morte" (2015), destaca a relação entre as vestimentas e acessórios da festa com a identidade e o sentimento de pertencimento das irmãs, dando destaque ao papel da indumentária na cultura e na fusão de tradições.

Renata conduziu o estudo como parte de um projeto de pesquisa, junto a estudantes da graduação em Jornalismo da UFRB. No total, foram três anos de trabalho. Segundo a docente, dois deles foram dedicados a esforços contínuos para construir laços de confiança com as integrantes da Irmandade. A história narrada por elas, então, somada a pesquisas em fontes literárias, revelou informações valiosas sobre o grupo e as peças por ele utilizadas. “Fomos estabelecendo um horizonte de compreensão da própria Irmandade para, depois, entender como a indumentária se institui como um dispositivo forte de pertencimento à confraria, mas que tem, também, um legado ancestral, restituindo heranças de diversas culturas”, relata Pitombo. A equipe do projeto também produziu ensaios fotográficos das irmãs e de suas vestimentas, o que a pesquisadora aponta como um momento de sensibilidade e conexão.

Em sua pesquisa, a professora destaca a relação das irmãs com as vestes usadas na Festa da Boa Morte, ressaltando dois elementos centrais. Em primeiro lugar, está o reconhecimento do valor simbólico e ancestral de cada peça utilizada na celebração. Renata explica que fazem parte da indumentária das irmãs adereços de origem muçulmana, saias de influência portuguesa, além do camisu, ou “camisa de crioula”, e o pano-da-costa, entre outras diversas referências afro-brasileiras. “Tem uma mistura muito grande de elementos que compõem essa vestimenta, com diferentes legados. Elas têm essa consciência, principalmente do legado africano e dessa ancestralidade. É uma memória que é reativada a partir do momento em que elas se vestem com essas peças”, diz a docente.

O segundo elemento é o vínculo afetivo que elas estabelecem com as roupas e adereços. Sobre isso, Pitombo exemplifica: "a gente lê em algumas pesquisas que, inclusive, muitas irmãs solicitam que sejam enterradas com a vestimenta da Irmandade, o que revela esse traço de vínculo emocional". Reconhecida como o pioneiro movimento feminista afro-abolicionista da Bahia, a confraria tem marcas do enfrentamento ao regime escravocrata, do sincretismo religioso e da pluralidade cultural. Em suas cores, a Festa da Boa Morte envolve, especialmente, o branco – monocromático no primeiro dia de festejo –, o preto e o vermelho, que se intercalam e se conversam nas datas seguintes, representando, de um lado, o luto e, do outro, a vida. Assim, o livro da docente do PPGCOM e a própria História mostram que as vestes da Boa Morte têm muito a dizer, em uma combinação rica e ancestral. Do luto à luta, tudo está documentado em seus tecidos.

Clique na imagem para acessar o livro!

PPGCOM23 AGO post 06 02

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Pesquisa da Prof. Drª Renata Pitombo Cideira, docente do PPGCOM-UFRB, investigou por três anos as simbologias das indumentárias usadas pela Irmandade da Boa Morte em uma das festividades mais importantes da Bahia.

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